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BÓREAS

 

Hino Órfico 80: Bóreas, Vento Norte -Fumigação: Olíbano

De ventos invernais o movedor, profunda ventania do cosmo,

Gélido Bóreas, vem, da nevada trácia,

dissolve a sedição das nuvens do ar umente

agitando a água imbrífera e sua umidade;

tu clareias todo o céu e faz florescer a face do Éter,

como os raios do sol que brilham sobre a terra.

(Tradução de Rafael Brunhara)

CRONOS

Hino Órfico a Cronos, com incenso de estoraque

Viçoso sempre, pai dos venturosos deuses e dos homens,

astuciador límpido de magna força, bravo Titã,

tu mesmo, que a tudo consomes e novamente fazes crescer,

inquebráveis os grilhões que deténs no cosmo sem fim,

eterno Cronos pai de todos, Cronos de variado falar, (5)

rebento da Terra [Gaia] e do Céu[Urano]constelado,

és a geração, o crescimento e o fim, marido de Reia, insigne Prometeu,

que habitas em todas as partes do cosmo, rei ancestral,

de curvo pensar, o melhor! Atendendo a minha súplice voz,

envias um fim de vida bem afortunado, para sempre impecável. (10)

(Tradução: Rafael Brunhara)

 

 

CURETES

 

Hino Órfico aos Curetes

Lépidos Curetes em passos marciais,

pulsando o chão com os pés, rugentes nos montes bradando evoés;

liristas dissonantes, cavaleiros de rastros sutis;

armígeros guardiões, generais de esplêndida fama,

orgifantes, companheiros da mãe que delira nas montanhas;

Peço, vinde benfazejos por minhas auspiciosas palavras,

sempre afáveis ao boiadeiro, com um grato coração.

(tradução de Rafael Brunhara)

DEMÉTER

 

Hino Órfico (#40) a Demeter Eleusinia:

Deo, divina mãe de todos, deusa de muitos nomes,

augusta Deméter, educadora de jovens e doadora de prosperidade e riqueza;

Tu nutres as espigas de milho, ó doadora de tudo,

e tu te delicias na paz e no laborioso trabalho de parto.

Presente na semeadura, empilhagem e debulha, és o espírito do fruto não-maduro,

tu que habitas no sagrado vale de Eleusis.

És charmosa e amável, dás sustento a todos os mortais,

foste a primeira a pôr o arado no boi para lavrar a terra

e a enviar de cima a baixo uma adorável e rica colheita aos mortais.

Através de ti, tudo cresce e brota, ó ilustre companheira de Bromio

e, carregando a tocha e sendo pura, delicias-te com a produção do verão.

De debaixo da terra apareces e com todos és gentil,

Ó sagrada cuidadora dos jovens e amantes das crianças e da boa descendência.

Tu conduzes tua carruagem com rédeas nos dragões,

e circulas teu trono girando e uivando em êxtase.

Com filha única, mas com muitas crianças e muitos poderes sobre os mortais,

Tu manifestas tua miríade de rostos à variedade de flores e botões sagrados;

venha, abençoada e pura, e carregada dos frutos do verão,

traga paz junto com as regras de boas-vindas da lei,

riquezas também, e prosperidade, e saúde que nos governa a todos.

 

Hino Homérico XIII - A Deméter

Começo a cantar à Deméter de cabelos opulentos, a temível deusa, a ela e à sua amável filha Perséfone. Saúdo-te, deusas! Mantenham esta cidade segura, e governem a minha canção.

(traduções da Alexandra)

 

Hino Homérico 2, a Deméter

Canto Deméter, de belos cabelos, deidade solene,

Junto da filha de esguios tornozelos, a quem Edoneu

Arrebatou por presente de Zeus de ampla vista, troante,

Longe Deméter de espada dourada, de fruto brilhante,

Quando brincava entre as oceaninas, de bustos profundos,

De colher flores de rosa, açafrão e violetas bonitas,

Sobre um gramado macio, e de íris bem como jacinto,

E de narciso – num dolo de Gaia à garota florente

Dentro do plano de Zeus, alegrando o que tudo recebe –,

Maravilhoso e brilhante: um espanto de ver para todos,

Para os eternos divinos e para os humanos mortais.

Dele a partir das raízes cem brotos de flor despontavam.

Dúlcido odor exalava, tão doce que tudo, do céu

À vasta terra e até a onda salina do mar lhe sorriu.

Maravilhada, buscou alcançá-lo com ambas as mãos,

Belo ornamento. Porém a vastívia terra se abriu

Junto à planície de Nisa e o que tudo retém irrompeu

Com montaria imortal, o Cronida de múltiplos nomes.

Tendo-a tomado contrário à vontade, ao palácio dourado

Foi-se com ela em lamentos. Gritava com voz incessante

Súplica ao pai que de Crono nasceu, o mais alto e mais nobre.

Nenhum dos deuses eternos, nenhum dos humanos mortais

Pôde escutar sua voz, nem olivas de frutos brilhantes,

Mas a donzela nascida de Perses, de tenro pensar,

Hécate, do diadema esplendente, da gruta a escutou,

E Hélios também, o senhor que de Hipérion nasceu, reluzente,

Ouve o pedido da moça ao pai Crônida, mas apartado

Dos demais deuses estava, em seu templo onde muitos suplicam,

A receber oferendas venustas dos homens mortais.

Contra a vontade a levava (seguindo um alvitre de Zeus,

Pai da donzela, e irmão do que tudo retém e recebe)

Com imortal montaria o Cronida de múltiplos nomes.

Quanto ainda pôde mirar para terra e pro céu estrelado,

E para o mar de correntes possantes, repleto de peixes,

E para o brilho do sol, ela teve esperança de ver

A mãe zelosa e a família dos deuses eternossurgentes:

Tanto a esperança acalmava-lhe a mente sobeja na dor.

... E ressoaram os cumes dos montes e o fundo do mar

Junto da voz imortal: escutou-lhe sua mãe senhoril.

Dor aguçada assaltou-lhe no seu coração. Das madeixas

Ambrosiais, a mantilha rasgou com as mãos, em pedaços;

De ambos os ombros lançou para o chão o seu manto ciânico

E disparou como um pássaro ao longo da terra e das águas,

A procurar. Mas dizer a verdade não houve ninguém

Dentre os divinos nem dentre os humanos mortais que o quisesse,

Nem dentre as aves – nenhuma lhe foi mensageiro veraz.

Por nove dias depois pela terra, a senhora Deméter

Foi-se vagando com tochas acesas levadas às mãos.

Nem de ambrosia jamais nem de néctar, delícia potável,

Se alimentou, sofredora, nem água em seu corpo aspergiu.

Mas, quando a décima aurora chegou até ela, brilhante,

Hécate veio encontrá-la trazendo luzeiros nas mãos

E anunciando-lhe então proferiu a palavra e falou:

"Dona Deméter, que guia as sazões, donatária de luz,

Quem dentre os deuses celestes ou dentre os humanos mortais,

Rapta Perséfone e causa-te dor para o teu coração?

Voz eu ouvi, mas não pude contudo enxergar com os olhos

Quem o seria. De pronto, professo-te tudo sem erro."

Hécate assim lhe falou, mas não houve resposta em discurso

Vinda da filha de Reia, que subitamente com ela

Vai-se, com tochas acesas brilhando, portadas nas mãos.

A Hélios, chegaram, vigia dos deuses bem como dos homens.

Frente aos cavalos puseram-se e a deusa entre as deusas lhe disse:

"Hélios, ao menos, respeita-me, deusa que sou, se jamais

Minhas palavras ou feitos ao teu coração te aqueceram.

Moça eu gerei, um rebento tão doce, esplendente na forma.

Dela, pelo éter infértil, eu ouvi um gemido adensado

Como sofresse, porém com os olhos não pude mirá-la.

Tu, todavia, por tudo que existe na terra e no mar,

Do alto do éter divino perscrutas usando teus raios.

Diz-me sem falha: o querido rebento – se acaso tu viste –,

Quem, apartado de mim, agarrando em forçosa violência,

Foi que o levou, se um dos deuses ou um dos humanos mortais."

Disse-lhe assim. Em resposta o nascido de Hipérion falou-lhe:

"Filha de Reia, de belos cabelos, senhora Deméter,

Tu saberás, pois venero-te muito e de ti me apiedo,

Sôfrega pela menina de esguio tornozelo: não outro

Foi causador dentre eternos senão o nubícogo Zeus,

Que a concedeu para Hades chamá-la de esposa formosa;

Deu-a ao irmão, que, por vez, para o fundo do breu nevoento,

Rapta-a e a carrega em seu carro por mais que ela muito gritasse.

Cessa, contudo, divina, esse ingente gemido. Não deves

Ter tanta cólera em vão dessa forma. Não é um impróprio

Genro entre eternos aquele, Edoneu, o de múltiplos nomes:

É teu irmão; foi gerado em conjunto; também – quanto às honras

Que ele ganhou, quando em três a partilha foi feita de início –,

Entre os que vivem consigo, seu lote é ser rei sobre todos."

Tendo assim dito chamou os cavalos. Por sob ameaças,

Logo carregam o carro veloz quais alígeras aves.

Nela, vem dor mais terrível e infame no seu coração.

Pelo Cronida de nuvens escuras irada a tal ponto,

Ela apartou-se da grege divina e do Olimpo elevado

Indo às cidades dos homens e para seus fartos cultivos,

Branda em beleza por longo interstício. Ninguém dos varões

A distinguiu quando a viu, nem das damas de funda cintura,

Antes de que ela chegasse na casa do experto Celeu,

Que era senhor, nesse tempo, de Elêusis fragrante em incenso.

Com coração dolorido, sentou-se por perto da estrada,

Junto do poço da virgem, de que os cidadãos aduavam,

Num sombreado debaixo de onde cresciam olivas,

Assemelhada a uma velha vetusta, que da gestação

Já se gastou e dos dotes da amante de láurea Afrodite,

Da qualidade das amas de reis que ministram as leis

E governantas de infantes ao longo de ecoantes alcovas.

Viram-na as filhas do filho nascido de Elêusis, Celeu,

Vindo por água de fácil extração, que depois levariam

Dentro de jarras de bronze a caminho da casa paterna.

Quatro elas eram, quais deusas, ornadas na flor juvenil:

Bela Demó e Calídice, junto a Clesídice e ainda

Calitoé, que entre todas as outras nascera primeiro.

Não a souberam: os deuses são árduos de ver por mortais.

Pondo-se próximas dela, disseram palavras aladas:

"Quem és e donde, anciã, que nasceste entre os homens de outrora?

Qual a razão de partires da pólis, e nem das moradas

Te aproximares? Aqui há mulheres nas casas vultosas,

Velhas assim como tu, bem como outras mais jovens também.

Ambas teriam a ti por amiga em palavras e em atos."

Isso disseram. Então respondeu a senhora das deusas:

"Filhas queridas – quem quer que vós fordes em meio às mulheres –,

Eu vos saúdo e vos digo ademais que não é vergonhoso

Pronunciardes discursos dizendo palavras verazes.

Eu sou chamada Dosó. Deu-me o nome a senhora materna.

Vim logo agora de Creta no dorso comprido do mar,

Mesmo que não o quisesse, forçada em forçosa violência.

Homens ladinos levaram-me embora. Depois, em seguida,

Foram com rápida nau para Tórico. Lá, as mulheres

Desembarcaram em grupos, seguidas por eles,

E preparavam banquete do lado da proa da nau.

Mas coração não me aprouve o repasto gentil para mente.

Desembarcando em segredo, através da melânica terra,

Eu escapei dos meus mestres soberbos, que enfim não lucrassem

Com minha honra por me carregarem à venda no mar.

Vim para cá dessa forma, uma errante. Tampouco sabia

Qual era a terra e quem eram aqueles que aqui são nascidos.

Que vos concendam contudo os que fazem morada no Olimpo,

Todos, varões que vos sejam esposos, e dar luz a filhos,

Como desejam os pais: mas de mim tende pena, meninas.

Isso me estabelecei claramente, que assim eu o saiba,

Filhas queridas, zelosas, de quem é a casa a que chego?

De qual varão ou senhora? Que assim eu os sirva, zelosa,

Nos afazeres cabíveis a velhas mulheres fazerem.

Para um bebê neonato, levado em meus braços dobrados,

Belo cuidado daria e também manteria o palácio,

Esticaria os lençóis no interior das alcovas bem-feitas

Do meu senhor e os trabalhos iria ensinar às mulheres."

Disse a deidade. Depois, respondeu a virgínea donzela

Dita Calídice, que era a mais bela entre as filhas celeias:

"Mãe, os presentes dos deuses, por mais que soframos à força,

Nós suportamos, humanos, pois são bem mais fortes que nós.

Vou te dizer claramente isso tudo e informar-te por nome

Quais os varões a quem há um enorme poder nesta terra,

Eles que têm o respeito do povo e a mantilha da pólis

Salvam por meio do alvitre e da sua justiça escorreita:

Ambos Triptólemo de resoluta vontade e Diócles,

E Polixeno também junto do irreprovável Eumolpo,

Junto de Dólico bem como de nosso pai varonil.

Há para todos esposas que cuidam do lar nos palácios.

Dentre elas todas, não há quem iria à primeira das vistas,

Desestimando-te a forma, da casa por isso expulsar-te,

Mas, sim, irão receber-te, pois és claramente deiforme.

Se tu quiseres, espera, que iremos à casa paterna

Para informar nossa mãe, Metaneira de funda cintura,

Desses assuntos, de todos, a fim de que sejas chamada

À nossa casa, não tendo que uma outra morada buscar.

Ela possui um só filho, tardio, no palácio bem-feito,

Tardinascido, mas muito bem-vindo após múltiplas preces.

Se tu puderes criá-lo até ter a medida de jovem,

Mui facilmente qualquer das femíneas mulheres, ao ver-te,

Te invejaria: são dádivas tais que em criá-lo terias."

Disse-lhe assim. Assentiu por sua vez com o rosto. Luzentes

Baldes então tendo enchido com água, carregam, briosas.

Logo chegaram no enorme palácio paterno e contaram

Rápido à mãe o que viram e ouviram. Mais rápido ainda,

Vindo ordenou que a chamassem a fim de ter paga infinita.

Elas, quais cervos ou mesmo bezerros que na primavera

Vão saltitando num prado, aplacado o desejo com pasto,

Elas assim, segurando nas dobras das vestes amáveis,

Iam correndo por via deserta. Ao redor, os cabelos

Sobre seus ombros fluíam semelhos à flor do açafrão.

Próximo à estrada encontraram a deusa esplendente onde a haviam

Antes deixado. Depois para a casa do pai estimado

Foram à frente. Detrás com o seu coração dolorido,

Ela seguia com rosto abaixado. Ao redor, um vestido

Cor do oceano envolvia-lhe os pés delicados de deusa.

Logo a mansão de Celeu alcançaram, aluno de Zeus.

Foram adentro do pórtico até onde a mãe senhoril,

Junto à coluna do teto de firme feitura, sentava

Com um bebê neonato no colo. Acorreram-lhe as filhas.

Mas, quando pôs os seus pés na soleira, alcançou o batente

Com a cabeça e um divino esplendor preencheu os umbrais.

Por reverência, respeito e esverdeado temor foi tomada.

De seu assento se ergueu e ordenou que ela ali se sentasse.

Mas não Deméter que guia as sazões, donatária de luz:

Não desejou se assentar sobre o trono de aspecto brilhante,

Mas se mantinha silente com seus belos olhos baixados

Antes de Iambe, sabendo cuidados, dispôr para ela

Outra cadeira, do lado, e cobri-la com peles argênteas.

Lá se sentando, mantinha seguro nas mãos o seu véu.

Por muito tempo, sofrendo silente, quedou sobre o banco.

Nem por palavras saudava as pessoas tampouco por gestos,

Mas sem risada, mantendo o jejum, sem comer nem beber,

Ela minguava à saudade da filha de funda cintura,

Antes de Iambe, sabendo cuidados, por meio de troças

Muitas, fazendo piadas, mudar a solene senhora

Para se rir e sorrir e ter ânimo mais benfazejo.

(Ela mais tarde também, num porvir, agradou seus humores.)

Oferecia-lhe então Metaneira uma taça que enchera

Com vinho doce qual mel, mas não quis. Disse impróprio tomar

Vinho vermelho. Mandava que dessem cevada com água

Mistas, a fim de tomar com um toque gentil de poejo.

Feita a poção, ofertou-a conforme pedira, à deidade.

Tendo a aceitado por sacro costume, Deméter excelsa

... Principiou Metaneira de bela cintura a falar-lhe:

Salve, mulher! Eu não temo que vinda de maus genitores

Sejas, mas sim de excelentes, pois vê-se respeito em teus olhos

E gratidão, como se descendesses de reis julgadores.

Mas os presentes dos deuses, por mais que soframos à força,

Nós suportamos, humanos, pois tem-se o pescoço no jugo.

Mas como aqui tu chegaste, terás tudo quanto eu puder:

Cria meu filho, nascido tardio para além da esperança,

Este que os deuses mandaram, que é muito querido de mim.

Se tu puderes criá-lo até ter a medida de jovem,

Mui facilmente qualquer das femíneas mulheres, ao ver-te,

Te invejaria: são dádivas tais que em criá-lo terias."

Por sua vez, proferiu-lhe Deméter de bela coroa:

"Eu te saúdo, mulher! Que os divinos te deem benesses!

Receberei de bom grado o teu filho, conforme me ordenas.

Hei de criá-lo e jamais por descuido da sua babá

Há de um feitiço afligi-lo nem mesmo "o que ceifa por baixo",

Pois sei de antídoto muito mais forte que "o ceifa-madeira",

Sei de excelente resguardo a feitiço de múltiplas dores."

Tendo dessarte falado aceitou-o no peito oloroso

Com suas mãos imortais. Em seu íntimo alegra-se a mãe.

Dessa maneira passou a criar no palácio o brilhante

Filho do arguto Celeu, Demofonte, que de Metaneira

Bem-cinturada nascera. Cresceu como um par dos divinos:

Pão não comia, nem mesmo sugava do leite da mãe,

Visto que ao longo do dia Deméter de bela coroa

Com ambrosia o ungia, qual fosse rebento de um deus,

Tendo-o bem junto do peito e insuflando-o com sopro adoçado;

Mas pela noite encobria-o em chamas, qual fosse um tição,

Sem que seus pais o soubessem. Crescia-lhes como um prodígio,

Tanto precoce cresceu: parecia ser um dos divinos.

E com efeito o teria tornado imortal, sem velhice,

Caso, com insensatez, Metaneira de bela cintura,

Espionando de noite a partir de seu quarto oloroso,

Não os notasse. Mas ela gritou e espalmou suas coxas,

Apavorada por conta do filho e afligida em seu peito,

E lamentando-se então proferiu as palavras aladas:

"Meu Demofonte, a estrangeira com chamas ingentes te encobre

E me coloca em gemidos e preocupações lutuosas!"

Disse dessarte em lamento, e a divina entre as deusas a ouviu.

Colerizada com ela, Deméter de bela coroa,

Tendo tirado do fogo com mãos imortais o menino

Que ela gerara na casa já quando não tinha esperança,

Lança-o no chão, irritada no seu coração sobremodo,

E ao mesmo tempo maldiz Metaneira de bela cintura:

"Néscios humanos! Ineptos em reconhecer a medida

De quanto bem sobrevém para vós tanto quanto do mal!

Tu pela tua insciência causaste incurável ferida!

Saiba-se a jura dos deuses, pela água implacável do Estige,

Pois imortal e também sem velhice, por todos os dias,

Tua criança eu teria tornado, com honra indelével.

Ora não mais poderá se evadir do destino e da morte.

Honra indelével lhe irá persistir para sempre, contudo,

Por ter subido em meu colo e dormido amparado em meus braços.

Ao lhe chegarem as Horas e os anos findando seu curso,

Vede que os filhos de Elêusis com guerras e gritos terríveis

Vão engajar-se uns aos outros, constantes, por todos os dias.

Eu sou Deméter, quem honras detém, geratriz dos maiores

Júbilos para imortais e mortais e também benefícios.

Vamos agora! Que um templo bem grande e um altar logo abaixo

Os cidadãos sob a pólis e as altas muralhas me façam

Sobre o Calícoro, na cumeeira de um monte elevado.

Ritos secretos eu mesma vos ensinarei, que depois

Ao perfazê-los sem mácula ireis alegrar meu sentido."

Tendo assim dito, a deidade alterou sua forma e estatura,

Posta a velhice de lado. Ao redor exalava beleza:

Desde os vestidos fragrantes um amabilíssimo olor

Se dissipava; de longe luzia da derme imortal

Brilho da deusa; dourados cabelos cresciam-lhe aos ombros;

Com o clarão preencheu-se a morada robusta, qual raio.

Foi-se em seguida da casa. Já dela os joelhos vacilam:

Permaneceu muito tempo sem voz, nem sequer do menino

Tardinascido lembrou, de tomá-lo de volta do chão.

Suas irmãs todavia escutando-lhe a voz lamentável

Logo saltaram dos leitos cobertos: então uma delas

Tendo o tomado nas mãos o coloca de junto do peito;

Outra reacende a lareira; e a terceira, com pés delicados,

Logo se apressa em trazer sua mãe do aposento fragrante.

Aglomeradas em torno lavavam-no enquanto chorava,

Dando-lhe muito carinho, mas seu coração não calmava:

Eram piores as aias e as amas que agora o guardavam.

Elas então toda a noite aplacavam a deusa famosa,

Trêmulas pelo terror. No momento em que a Aurora surgiu,

Ao poderoso Celeu infalíveis palavras disseram,

Como mandara a deidade de bela coroa, Deméter.

Ele, depois de chamar para a ágora o povo abundante,

Manda que um templo opulento a Deméter de belos cabelos

Façam, também um altar sobre o cume de um monte elevado.

Eles de pronto escutaram e lhe obedeçaram aos ditos.

Como mandara, fizeram; e o filho cresceu como um nume.

Quando por fim terminaram e deram por feito o trabalho,

Foram-se ao lar, cada qual para o seu, mas a loura Deméter,

Lá se sentando apartada de todos os outros ditosos,

Inda minguava à saudade da filha de funda cintura.

O mais terrível dos anos na terra de farto sustento

Fez para os homens, um ano de cão. As sementes, a terra

Não germinava: ocultava-as a bem-coroada Deméter.

Muitos arados recurvos os bois arrastavam em vão.

Muita cevada brilhante no chão se jogou sem sucesso.

Ela teria arrasado a linhagem dos homens mortais

Pela estiagem terrível, privando das honras famosas

E sacrifícios aqueles que fazem morada no Olimpo,

Zeus não houvesse notado e no espírito então compreendido.

Íris primeiro aurialada enviou para que ela chamasse

A de adorável figura, Deméter de belos cabelos.

Disse. Ela ao mando de Zeus, do Cronida de nuvens escuras,

Obedeceu e cruzou o entremeio com rápidos pés.

Logo chegou à cidade eleusina, fragrante de incenso,

Onde no templo encontrou, com vestido soturno, Deméter,

E lhe falou, proferindo as seguintes palavras aladas:

"Zeus pai te chama, Deméter, o sábio em saberes perenes,

Para que vás à família dos deuses eternossurgentes.

Vai! E que não se descumpra a palavra de Zeus que lhe digo!"

Disse-lhe assim, suplicante, mas seu coração não consente.

Mais uma vez, o pai manda-lhe os deuses ditosos e eternos,

Todos, um deus atrás de outro. Partindo ordenados assim,

Eles chamavam-na e davam presentes venustos e vários

E honras também, tantas quantas pudesse querer entre eternos.

Mas ninguém pôde suadir as entranhas nem o pensamento

Dela iracunda no seu coração: rechaçava os discursos,

Pois prometera jamais ascender para o Olimpo fragrante

Nem enviar para cima, de dentro da terra, a colheita

Antes de ver com seus olhos a filha de belo semblante.

Zeus que ressoa profundo, o de vasta visão, quando o ouviu,

Fez com que o auricetrado argicida para o Érebo fosse:

Que ele falando de perto palavras suaves com Hades

Exconduzisse Perséfone augusta do breu nevoento

Rumo da luz junto aos deuses, a fim de que então sua mãe

Ao contemplá-la com seus próprios olhos cessasse o rancor.

Hermes não desacatou, mas de súbito ao fundo da terra

Ele partiu apressado, baixando do assento do Olimpo.

Logo encontrou o senhor da morada no seu interior,

Em um sofá, reclinado com a pudorosa consorte

Muito contrário à vontade, saudosa da mãe, que à distância

Planos terríveis pensava por atos dos deuses ditosos.

Pondo-se próximo dele, falou-lhe o potente Argicida:

"Hades de negros cabelos, reinante entre os já perecidos,

Zeus pai mandou-me guiar para fora Perséfone augusta

Do Érebo para com eles, a fim de que a mãe, vendo a moça

Com olhos próprios, refreie o rancor e sua cólera horrível

Contra os eternos, pois ela intenciona um ingente trabalho:

Arruinar a impotente família dos homens terrestres

Ao ocultar as sementes na terra, privando das honras

Os imortais. Ela tem um terrível rancor, nem aos deuses

Junta-se, mas no interior de seu templo fragrante, apartada,

Senta-se enquanto retém a cidade rochosa de Elêusis."

Disse dessarte. Sorriu-lhe Edoneu, que entre os ínferos reina,

Com os sobrolhos, mas não descumpriu o comando de Zeus rei,

Pois de imediato ordenou a Perséfone percipiente:

"Vai-te, Perséfone, para tua mãe de vestido soturno,

Tendo uma força gentil em teu peito e no teu coração,

Nem tenhas ódio excessivo demais do que aos outros por mim.

Não te serei um consorte de nada indevido entre eternos,

Visto que sou mesmo irmão de Zeus pai. Quando aqui te encontrares,

Tu serás mestre de todos, de quantos viverem e andarem,

E honras ainda terás entre eternos, maiores que todas.

Dentre os injustos, terá pagamento por todos os dias

Quem não fizer sacrifícios a fim de agradar teu poder,

Feitos sem mácula, todos cumpridos com dons adequados."

Disse dessarte. Sorriu-lhe Perséfone muito prudente

Rapidamente se ergueu de alegria, mas ele, contudo,

Doces sementes lhe deu de romã, que comesse, em segredo,

Sendo cuidoso que não demorasse por todos os dias

Junto de novo a Deméter augusta de peplo soturno.

Os seus cavalos à frente do carro dourado no jugo

Pôs, imortais, Edoneu que exercita o comando de muitos.

Ela subiu para o carro e a seu lado o potente Argicida,

Tendo tomado nas mãos tanto as rédeas quanto o chicote,

Foi-se através do palácio e partiu: seus cavalos voaram.

Atravessaram velozes estradas compridas. Nem mar

Nem mesmo as águas dos rios nem os vales gramados dos montes

Nem as montanhas puderam deter seus cavalos eternos,

Que sobre todos singraram os ares profundos, correndo.

Fê-los parar onde estava Deméter de bela coroa,

Logo de frente do templo fragrante. Quando ela a notou,

Foi-se correndo qual mênade ao longo de um monte silvoso.

Já por seu turno, Perséfone, ao ver os belíssimos olhos

De sua mãe, afastou-se de carro e cavalos num salto

Para alcançá-la e lançou-se-lhe em torno ao pescoço, abraçando-a.

Mas, ao reter sua filha querida no entorno das mãos,

Seu coração desconfia de um dolo e recua em terror.

Logo, cessando o carinho, em discurso lhe fez a pergunta:

"Filha, encontrado-se ao fundo da terra tu não me comeste

De um alimento? Relata e não guardes: que as duas saibamos,

Para que, vinda da tua estadia com Hades horrível,

Possas viver junto a mim e ao Cronida de nuvens escuras,

Tendo honrarias também entre todos os outros eternos.

Mas, se comeste, de novo voltando ao profundo da terra,

Tu morarás por um terço das Horas a cada um dos anos,

E as outras duas ao lado de mim e dos outros eternos.

Mas, quando a terra com flores fragrantes e primaveris

De toda sorte florir, novamente do breu nevoento

Tu voltarás, grande espanto aos divinos e aos homens mortais.

Mas dize como levou para baixo do breu nevoento

E com que dolo raptou-te o potente que tudo retém."

Disse-lhe então em resposta Perséfone muito venusta:

"Eu para ti, minha mãe, vou dizer por completo a verdade.

Quando a mim Hermes chegou, mensageiro veloz que traz sorte,

Para, à presença do Crônida pai e dos outros celestes,

Do Érebo me retirar, que me vendo com teus próprios olhos

Apaziguasses rancor aos eternos e cólera horrível,

Eu, de imediato, saltei de alegria. Mas ele, em segredo,

Doces sementes me deu de romã com que me alimentasse,

E a contragosto por meio de força forçou-me a comê-las.

Como levou-me por sólida astúcia do filho de Cronos,

Meu próprio pai, carregando-me para o profundo da terra,

Eu contarei e direi sobre tudo conforme me pedes.

Todas de fato brincávamos sobre um gramado amorável:

Fano e Leucipo assim como Electra e também Ianté,

Junto a Melite e Iaqué, com Rodeia e Caliroé,

Com Melobósis e Tíque e com Ociroé rosto-em-flor,

E com Criseida, Ianeira, Acaste, e também Admete,

E Rodopé e Plutó e também a amorável Calipso,

E com Estige e Urânia e com Galaxaure adorável,

Junto de Palas guerreira e com Ártemis atiradora,

Todas brincávamos de colher flores amáveis nas mãos,

Entre o açafrão delicado e entre a íris, jacinto também,

Bem como brotos de rosas e lírios, espanto de ver,

E de narciso, que a terra gerava semelho a açafrão.

Tudo eu colhia feliz, mas a terra, por baixo, se abriu:

Dela saltou o senhor poderoso que tudo retém,

Que me levou para baixo da terra em seu carro dourado,

Muito contrário à vontade. Na voz, eu gritei estridores.

Essa, por mais que me doa, te digo ser toda a verdade."

Elas, concordes em ânimo, então, pelo resto do dia,

Muito no seu coração e em seu ânimo se acalentaram

Com calorosos abraços, cessando-se a dor em seu ânimo.

Muita alegria uma a outra ofertava e também recebia.

Aproximou-se-lhes Hécate do diadema esplendente.

Muito abraçou a menina sagrada nascida a Deméter.

Desde esse tempo a senhora lhe foi atendente e ministra.

Zeus de amplo olhar, que ressoa profundo, enviou-lhes de núncio

Reia de belos cabelos, a fim de que à grei dos divinos

Ela levasse Deméter de escuro vestido. Honrarias

Lhe prometeu, quais pudesse querer entre os deuses eternos,

E concordou que sua filha demore, por cada um dos anos,

Uma das tríplices partes abaixo do breu nevoento

E as outras duas ao lado da mãe e dos outros eternos.

Disse e a deidade não desacatou as mensagens de Zeus.

Rapidamente, lançou-se voando dos picos do Olimpo.

Logo chegou até Rário, nutriz, a mais rica das terras

Antes, porém nesse tempo não era nutriz, mas inerte,

Toda sem folhas. A branca cevada encontrava-se oculta:

Plano que foi de Deméter de esguios tornozelos. Contudo,

Logo se iria cobrir com espigas compridas de milhos,

Ao florescer da estação, e os opíparos sulcos da terra

Logo estariam repletos de grãos e de feixes de espigas.

Lá sobreveio primeiro partindo do éter infértil.

Mutuamente se viram, contentes, com ânimo alegre.

Reia com seu diadema esplendente lhe disse o seguinte:

"Vamos, filhinha, que Zeus de amplo olhar, que ressoa profundo,

Chama-te junto da grei dos divinos. Também honrarias

Lhe prometeu, quais puderes querer entre os deuses eternos

E concordou que tua filha demore, por cada um dos anos,

Uma das tríplices partes abaixo do breu nevoento

E as outras duas ao lado da mãe e dos outros eternos.

Disse cumprir-se dessarte e assentiu com a sua cabeça.

Vem, minha filha! Obedece o que digo! De modo excessivo,

Não te enfureças mais com o Cronida de nuvens escuras.

Faz com que cresçam os frutos nutrizes de pronto aos humanos."

Disse, e Deméter de bela coroa não desobedece.

Logo ela fez despontarem os frutos nos férteis terrenos.

Toda com folhas e flores também a vastíssima terra

Se carregou. Em seguida, indo aos reis que ministram as leis,

Ela mostrou a Triptólemo e para Diócles ginete

E para a força de Eumolpo e a Celeu, comandante de povos,

A liturgia dos ritos e a todos também os mistérios.

Mas, para força de Eumolpo e a Celeu e também a Diócles,

Deu ritos sacros, que não se transgridem nem mesmo se aprendem,

Nem se proferem, pois grande respeito aos divinos os cala.

Próspero é aquele que os viu entre os homens que vivem na terra;

Mas incompleto quem não participa dos ritos, nem nunca

Tem bom destino morrendo, debaixo do breu nevoento.

Logo depois, quando tudo perfez a divina entre os deusas,

Foi-se a caminho do Olimpo ao encontro dos outros divinos,

Onde demoram do lado de Zeus que se apraz com trovões,

E junto à augusta e sagrada. Muitíssimo próspero é quem

Eles solícitos amam, dos homens que vivem na terra.

Logo lhe enviam ao fogo do lar no seu grande palácio

Pluto, que ao homens mortais oferece abundância e riqueza.

Mas vamos lá, portadora da terra fragrante eleusina,

Paros marinha e a rochosa cidade de Antrona também,

Dona que cedes a luz, que conduz as sazões, Deo rainha,

Tu e também tua filha Perséfone, muito venusta,

Pela canção, meu sustento agradável, solícitas, manda!

Ora de ti eu irei me lembrar e de uma outra canção!

(Tradução de Leonardo B. Antunes)

DIONISO

 

Hino Homérico VII - A Dioniso

De Dionísio, o glorioso rebento da augusta Semele,

Lembrarei, como à ourela do mar infecundo surgiu,

Sobre um cabo saliente, na forma de um jovem varão

Inda imberbe, os seus belos e negros cabelos flutuando,

e portando nos ombros robustos um pálio de cor

Purpurina. Eis que logo num bem cobertado navio

Salteadores tirrenos surgiram do mar cor de vinho

Por madrasta fortuna impelido, e, ao verem-no, pronto

Entre si consentiram, e logo a prendê-lo avançaram,

E em seguida ao navio levaram-no, as mentes alegres

Confiavam-no filho de reis procedentes de Zeus,

E em cadeias possantes atá-lo quiseram por força.

Todavia as cadeias o não seguravam, e os elos

De seus pés e mãos se soltavam, enquanto, sentado

Com seus olhos noturnos se ria. O piloto, entendendo,

Conclamou logo os seus companheiros e disse o seguinte:

"Infelizes, que deus poderoso domar e prender

Pretendeis? Mesmo o nosso navio o não pode levar,

Pois sem dúvida é Zeus, ou Apolo das flechas de prata

Ou talvez Posêidon, já que aos homens mortais não parece,

Mas aos deuses que habitam na ampla morada do Olimpo.

Apressai-vos! Deixemo-lo em terra, na praia sombria,

Desde já nem co'as mãos o toquei, p'ra que não, irritado,

Fortes ventos excite e abundantes terríveis borrascas".

Assim disse, e o cruel capitão retrucou-lhe o seguinte>

"Infeliz, olha o vento e o velame da nave desferra,

Tendo as armas colhido, que deste os demais cuidarão

Pois espero que chegue ao Egito, ou que a Chipre ele chegue,

Ou país hiperbóreo, ou além; e que ao fim da jornada

Seus amigos nos diga e nos conte seus todos haveres,

Seus irmãos, pois é certo que um deus aqui no-lo entregou"

Disse, e o mastro fincou e o velame largou do navio,

E no bojo da vela sopraram os ventos. Em torno,

Dispuseram as armas. Mas logo surgiram prodígios...

Vinho doce e odorante, primeiro, jorrava da nave

E fluía fragrante e sonoro exalando um perfume

Imortal! Grande horror assaltou os marujos ao verem.

De repente, no topo do mastro alastrou-se uma vinha

Carregada de cachos, crescendo por todos os lados,

E do mastro ao redor enroscou-se uma hera noturna,

Toda em flores virente onde frutos ridentes pendiam;

As cavilhas cingiam coroas. Tal vendo, os marujos

Ao piloto premiam que a nau para a terra ligeiro

Dirigisse. Mas, dentro, em leão se tornou Dionísio

Que terrível por sobre o convés grandes urros lançava.

Já uma ursa felpuda no meio criou, prodigioso,

Que se alçou furibunda. O leão, no mais alto da ponte,

Fulminantes olhares lançava. Pra popa fugiram

E ao redor do piloto, que espírito calmo mantinha,

Se agruparam turbados. Mas subíto o leão atacou

O cabeça. Os demais, vendo aquilo, ao mal fado escapando,

Todos juntos se às águas do mar atiraram divino

E viraram golfinhos. Doeu-se porém do piloto,

E o reteve. fazendo-o feliz, o seguinte lhe disse:

"Nada temas, Hecátor, que ao meu coração és querido.

Sou Dionísio multíssono, aquele que foi concebido

Por Sêmele cadméia depois de por Zeus ser amada".

Salve filho de olhos formosos, Sêmele. É impossível,

Esquecendo de ti, se compor um cantar harmonioso.

(tradução de Jair Gramacho)

 

Hino Homérico XXVI - A Dionísio

Começo a cantar ao Dionísio coroado de hera, o deus do alto grito, esplêndido filho de Zeus e da gloriosa Semele. As ninfas de longos cabelos o receberam em seus âmagos do senhor seu pai e o criaram e o nutriram cuidadosamente no pequeno vale isolado de Nysa, onde pelo desejo de seu pai ele cresceu em uma caverna de doce aroma, sendo considerado e estimado entre os imortais. Mas quando as deusas os trouxeram para cima, um deus freqüentemente homenageado, então ele começou a perambular continuamente entre as os vales cobertos de árvores, densamente coroado de hera e louro. E as Ninfas seguiram atrás dele com ele como o líder delas, e a ilimitada floresta foi preenchida com os gritos deles. E então te saúdo, Dionísio, deus das abundantes aglomerações! Conceda que possamos vir novamente nos regozijar com esta estação, e com todas as estações adiante por mais um ano.

(tradução da Alexandra)

 

Hino a Dioniso de Anacreonte

Ó senhor, com quem brincam Eros domador e as Ninfas de olhos azuis e a radiante Afrodite, tu que rondas os cumes elevados das montanhas: eu te peço, vem até nós com boa vontade, escuta e realiza a minha graciosa prece: sê um bom conselheiro a Cleóbulo, para que ele aceite, ó Dioniso, a minha paixão.

(Furley-Bremer, 2001, tradução de José M. Macedo, enviada por Antonio)

 

Peã a Dioniso de Filodamo de Escarféia

[I]....ó Ditirambo,Baco, deus do êxtase, touro com uma guirlanda de hera nos cabelos,

Bramador,vem para cá nessa sagrada estação da primavera-evoé,ó iô Baco,ó iê Peã!-,

a quem um dia na extática Tebas Tiona do belo filho deu à luz, sendo Zeus o pai.Todos

os imortais puseram-se a dançar, todos os mortais em júbilo pelo teu nascimento,ó Baco.

- Iê Peã, vem Salvador, protege de bom grado essa cidade com próspera fortuna.

[II] Naquele dia a terra de Cadmo saltava feitos bacante, e o vale dos Mínios também e a

fértil Eubéia – evoé,ó iô Baco,ó iê Peã !-. Pejada de hinos, toda a sagrada e abençoada

região de Delfos dançava , enquanto tu, tu revelaste o teu corpo estrelado,tomando

posição nos penhascos do Parnaso na companhia das donzelas de Delfos.- Iê Peã, vem

Salvador ,protege de bom grado essa cidade com próspera fortuna.

[III] Brandindo a tocha nas tuas mãos- luz na escuridão da noite-, tu chegaste em teu

entusiasmo aos recantos de Elêusis cobertos de flores- ,evoé,ó iô Baco, ó iê Peã!-, onde

toda a nação da terra grega, em volta das testemunhas nativas dos mistérios sagrados,

invoca-te como Íaco : tu abriste aos mortais um porto contra os males, livre de pesares.

Iê Peã , vem salvador , protege de bom grado essa cidade com próspera fortuna.

[IV] ... e com coros... – Iê Peã, vem Salvador , protege de bom grado essa cidade com próspera fortuna .

[V] Daquela terra abençoada tu aportaste nas cidades da Tessália, nos recintos sagrados do olimpo e na famosa Piéria – evoé,ó iô Baco, ó iê Peã !-, e as Musas, coroando-se de

Pronto com hera cantaram e dançaram todas em círculo para tua honra, proclamando-te imortal para sempre e famoso Peã, e quem liderava a dança era Apolo.- Iê Peã, vem

Salvador, protege de bom grado essa cidade com próspera fortuna.

[VI]........

[VII]........

[VIII]...- Iê Peã, vem Salvador, protege de bom grado essa cidade com próspera fortuna.

[IX] O deus ordena aos anfitriões executarem a ação com rapidez, para que o deus que

atira longe contenha a sua ira – evoé, ó iô Baco, ó iê Peã ! – e apresentarem esse hino para o sagrado rebento fraterno (= Dioniso ) por ocasião do banquete anual dos deuses, e fazerem um sacrifício público quando das súplicas pan-helênicas da abençoada Hélade.

Iê Peã, vem Salvador, protege de bom grado essa cidade com próspera fortuna.

[X] Oh, feliz a afortunada a geração daqueles mortais que constrói ao senhor Apolo um

templo que não envelhece, que não se corrompe, um templo – evoé,ó iô Baco, ó iê Peã !

de ouro com estátuas de ouro [onde] as deusas rodeiam [Peã], o seu cabelo luzente com

marfim , adornado com uma guirlanda nativa.- Iê Peã, vem Salvador, protege de bom grado essa cidade com próspera fortuna.

[XI] Aos organizadores do quadrienal festival pítico , o deus deu ordem de instaurar em

honra de Baco um sacrifício e uma competição de vários coros circulares (= ditirambos ) – evoé, ó iô Baco , ó iê Peã !- e de erigir uma formosa estátua de Baco igual aos raios do sol nascente, sobre uma carruagem puxada por leões dourados, e de fornecer uma gruta conveniente ao santo deus. – Iê Peã, vem Salvador , protege de bom grado essa cidade com próspera fortuna.

[XII] Pois bem, acolhei Dioniso, deus das bacantes, e clamai por ele nas vossas ruas com coros coroados de hera: - evoé, ó iô Baco ,ó iê Peã ! -. Por toda a abençoada Hélade.

Salve senhor da Saúde! – Iê Peã!, vem Salvador, protege de bom grado essa cidade com próspera fortuna.

(Este Peã de Filodamo, dedicado a Dioniso, foi composto para a inauguração do sexto templo em Delfos - 340/339 AEC - e destinava-se à apresentação no festival da Teoxenia durante a primavera. Fonte: Furley-Bremer (2001), vol. 2, p.53 ss, tradução de J.M.Macedo, enviado por Antonio.)

 

Hino Órfico 29 a Perséfone, mãe de Dionísio Eubouleus:

Perséfone, abençoada filha do grande Zeus, filha única

de Deméter, venha e aceite este gracioso sacrifício.

Muita honrada esposa de Pluto, discreta e doadora da vida,

tu comandas os portões do Hades nas entranhas da terra,

Praxidikê (justiça exata) amavelmente trançada, pura flor de Deo,

mãe das Fúrias, rainha do mundo inferior,

a quem Zeus gerou em união clandestina.

Mãe do Eubouleus que tem várias formas e que ruge alto,

radiante e luminosa companheira de recreação das Estações,

augusta, toda-poderosa, rica donzela em frutos,

brilhante e de cornos, só tu és a amada dos mortais.

Na primavera tu rejubilaste nas brisas das campinas

e mostras tua figura sagrada nos brotos e frutos verdes.

Foste feita esposa de um raptor no outono,

e apenas tu és vida e morte para os mortais que labutam;

Ó Perséfone, pois tu sempre nutres tudo e matas tudo também.

Escutai, ó abençoada deusa, e enviai os frutos da terra.

Tu que floresces em paz, em saúde de mão suave,

e em uma vida de fartura transportas pelo ar a velha idade

em conforto até teu reino, ó rainha, e para o reino do poderoso Pluto.

 

Hino Órfico 30 a Dioniso:

Eu clamo ao estrondoso e festivo Dioniso,

primordial, de duas naturezas, duas vezes nascido, senhor Báquico,

selvagem, inefável, secretivo, de chifre duplo, de duas formas.

Coberto de hera, com rosto de touro, bélico, uivante, puro,

tu tomas a carne crua, tu tens festivais trienais,

envolto em folhagem, protegido por cachos de uvas.

Eubouleus de muitos recursos, deus imortal gerado por Zeus

quando este se uniu a Perséfone em união inenarrável.

Escuta atentamente à minha voz, ó abençoado,

e com tuas amas vestidas de beleza

sopra em mim um espírito de perfeita gentileza.

 

Hino Órfico 42 a Mise (o salvo das águas), com incenso de estoraque:

Eu chamo Dionísio, doador da lei, que carrega o talo de funcho,

A semente inesquecível e de muitos-nomes de Eubouleus,

E chamo a sagrada e inefável rainha Mise,

cuja natureza dupla é macho e fêmea.

Como o redentor Iaco eu te invoco, senhor, estejas tu deleitando-se

em seu fragrante templo em Eleusis, ou com a Mãe

com quem participas de ritos místicos na Frígia,

Ou rejubila-te em Chipre com a belamente coroada Citéria,

Ou ainda exultas em campos plenos de trigo ao longo do rio Egito,

Com sua divina mãe, a augusta Ísis de manto negro, e sua tríade de amas.

Senhora, vem, de coração gentil, a estes que competem por prêmios nobres.

 

Hino Órfico 44 a Sêmele (mãe de Dioniso):

Eu chamo a filha de Cadmo, rainha de tudo,

Bela Sêmele das amáveis madeixas e de colo cheio,

Mãe do jubilante portador do tirso, Dionísio.

Ela foi levada a uma grande dor pelo raio flamejante,

O qual, através dos desígnios de Zeus Cronida imortal, a queimou,

Ela, a quem a nobre Perséfone concedeu honras entre os homens mortais,

Honras dadas a cada três anos.

Então eles reencenam a dor lancinante por seu filho Baco,

O sagrado ritual da mesa, e os mistérios sagrados.

Agora a ti, deusa, eu suplico, filha de Cadmo, rainha,

Para que sejas sempre gentil com os iniciados.

 

Hino Órfico 45 a Dionísio, Bassareus (besouro) e Trienal:

Vem, abençoado Dionísio, deus do rosto de touro, concebido no fogo,

Bassareus e Baco, mestre de tudo, de muitos nomes.

Tu te delicias em espadas sangrentas e nas sagradas mênades,

Enquanto urras através do Olimpo, Ó ruidoso e frenético Baco.

Armado com o tirso e em extrema fúria, és honrado

Por todos os deuses e todos os homens que habitam a terra.

Vem, abençoado e saltitante deus, e traga alegria a todos.

 

Hino Órfico 46 a Dionísio Likinites (o desperto), com fumigação de maná:

Eu invoco a estas preces Dionísio Liknites, nascido em Nisa,

Florescente, amado e gentil Baco,

Cuidado pelas ninfas e pela Afrodite de bela guirlanda.

A floresta já sentiu teus pés moverem-se na dança,

Como o frenezi te conduziu às graciosas ninfas,

E os desígnios de Zeus trouxeram-te à nobre Perséfone,

Que te criou para ser amado pelos deuses imortais.

Vem, ó abençoado, de coração gentil, e aceite o presente deste sacrifício.

 

Hino Órfico 47 a Perikionios (preso à coluna), com incenso de ervas aromáticas:

Eu chamo a Baco Perikionios, doador do vinho,

Que envolveu toda a casa de Cadmo e, com seu poder,

Verificou e acalmou a pesada terra quando o raio luziu

E a furiosa ventania todos os campos sacudiu.

Então os laços de todos se soltaram livres.

Abençoado folião, venha com um jubiloso coração.

 

Hino Órfico 48 a Sabazios (Zeus, pai de Dioniso), com incenso de ervas aromáticas:

Ouça-me, pai Sabazios, filho de Cronos, ilustre deus.

Tu que costuraste em tua coxa o Dionísio báquico, o ruidoso Eiraphiotes,

Que ele possa vir inteiro ao nobre Tmolos, ao lado da Hipta de belas bochechas.

Mas, ó abençoado governante da Frígia e supremo rei de todos,

Vem de coração gentil em auxílio dos iniciados.

 

Hino Órfico 49 a Hipta (ama de Baco), com incenso de ervas aromáticas:

Eu chamo Hipta, ama de Baco, donzela possuída.

Nos ritos místicos ela toma parte, e exulta-se no culto puro de Sabos,

E na noite ela dança ao ruidoso Iaco.

Ó rainha e mãe ctônica, ouça minha prece, esteja tu no Ida,

na sagrada montanha da Frígia, ou deleitando-se em Tholos, o justo assento dos Lídios.

Vem a estes ritos, com alegria em teu rosto sagrado.

 

Hino Órfico 50 a Lysios – Lenaios (o libertador, a vinha):

Ouça, ó abençoado filho de Zeus e de duas mães,

Baco da vinha, inesquecível semente, espírito redentor de muitos nomes,

Prole sagrada dos deuses, nascido em segredo, festeiro Baco,

Doador abundante das muitas alegrias de frutos que crescem profícuos.

Deus poderoso e de muitas formas, da terra irrompes para alcançar a vinha,

E nela te tornas um remédio às dores humanas, ó sagrado florescer!

Uma alegria que odeia a tristeza és para os mortais, ó Epaphian de amáveis cabelos,

És um redentor e um folião, cujo tirso conduz ao frenezi,

E que tem um coração amável com todos, deuses e mortais, que vêem tua luz.

Eu te chamo a vir agora, ó doce portador de frutos.

 

Hino Órfico 52 ao Deus do Banquete Trienal (em Tebas), com incenso de ervas aromáticas:

Eu te chamo, abençoado, de muitos nomes e frenético Baco,

De chifres de touro, redentor de Nísia, deus da vinha, concebido em fogo.

Criado na coxa, Ó Senhor do Berço,

Tu que guias procissões à luz da tocha, Ó Eubouleus, sacudidor do adornado tirso.

Tríplice é tua natureza e inefáveis são teus ritos, ó secreta prole de Zeus.

Primordial, Erikepaios, pai e filho de deuses,

Tu tomas a carne crua, e, com teu cetro, conduzes à loucura da folia e da dança

No frenezi dos festivais trienais que nos concedes calmamente.

Tu irrompes da terra em uma chama... Ó filho de duas mães,

E, usando chifres e vestindo pele de corço, tu perambulas pelas montanhas,

Ó senhor cultuado em banquetes anuais.

Peã da lança dourada, lactente, coberto de uvas,

Bassaros, exultante em hera, seguido de muitas donzelas...

Jubiloso e todo-abundante, vem, Ó abençoado, aos iniciados.

 

Hino Órfico 53 ao Deus do Banquete Anual (em Atenas), com incenso de todas as coisas que não sejam olíbano, e com uma libação de leite também:

Eu chamo o Baco que cultuamos anualmente, o ctônico Dionísio,

O qual, junto com as ninfas de belas madeixas, é despertado.

Nos sagrados salões de Perséfone ele descansa,

E põe em um sono puro o tempo báquico, a cada terceiro ano.

Quando ele próprio agita-se na trienal folia novamente, ele canta um hino,

Acompanhado por suas amas de belas cintas,

E, enquanto giram as estações, ele faz adormecer e acordar os anos.

Mas, Ó Baco abençoado e doador-de-frutos, Ó espírito cornífero do fruto imaturo,

Vem a este rito mais sagrado com o brilho da alegria em tua face,

Vem, todo abundante em um fruto que é sagrado e perfeito.

 

Hino Órfico 54 aos Silenos, Sátiros e Bacantes, com incenso de olíbano em pó:

Ouça-me, pai adotivo e nutridor de Baco, de longe o melhor dos Silenos,

Honrado por todos os deuses e pelos homens mortais nos mesmos banquetes trienais.

Puro e honrado mestre de cerimônias da banda pastoril,

Folião vigilante e companhia das amas de belas cintas,

Líder das Naiades e Bacantes coroadas de hera,

Pegue todos os Sátiros - metade homens e metade feras - e venha urrar ao senhor báquico.

Com as Bacantes escolta a procissão sagrada da Lenaia,

Em sacras litanias revelando os ritos à luz da tocha,

Berrando, amando o tirso, e encontrando calma nos festejos.

 

Hino Órfico 74 a Leucotéia (ama de Dioniso), com incenso de ervas aromáticas:

Eu chamo Leucotéia, filha de Cadmo, reverente deusa,

Poderosa nutridora do Dionísio de belas grinaldas.

Escuta-me com atenção, Ó deusa, mestra do mar de colo profundo,

Tu que te delicias em ondas e és aos mortais a maior das salvadoras.

De ti depende o ímpeto instável dos navios marinhos,

E apenas tu salvas os homens da desditosa morte no mar,

Homens a quem tu rapidamente vens como bem-vinda salvadora.

Mas, ó divina senhora, vem em auxílio dos navios bem-guarnecidos e gentilmente salve-os,

Trazendo ao mar um belo vento de popa aos iniciados.

 

Hino Órfico 75 a Palaemon (o destruidor), com incenso de olíbano em pó:

Companheiro do jubiloso Dionísio nas festas dançantes,

Que habita na pureza do mar, nas profundas turbulências,

Eu te chamo, Ó Palaemon, a vir a estes ritos sagrados, com gentileza em teu coração,

E alegria em tua face juvenil, para salvar teus iniciados na terra e no mar.

Quando no inverno, tempestades vêm até os navios que sempre vagueiam pelos mares,

Apenas tu apareces encarnado para salvar os homens,

E manténs severa ira contra a elevação salgada das ondas.

(traduções da Alexandra)

DIÓSCUROS

 

Hino Homérico XVII - Aos Dióscuros

Castor e Polideuces canta, Musa de límpida voz,

Tindáridas de Zeus Olímpio nascidos.

a eles sob os vértices do Taigeto engendrou veneranda Leda

em segredo subjugada ao nuvem-turvo Cronida

Salve Tindáridas, cavaleiros de ágeis corcéis.

(tradução de Rafael Brunhara)

 

Hino Homérico XXXIII: Aos Dióscuros

Acerca dos jovens de Zeus falai, Musas de vivazes olhos,

Dos Tindáridas, os filhos esplêndidos de Leda de belos tornozelos

Cástor doma-corcéis e irrepreensível Polideuces,

A eles sob o vértice do alto monte Taigeto

Unida em amor ao nuvem-turvo Cronida

engendrou, meninos salvadores dos homens da terra

e alígeras naus, quando se azafamam procelas

invernais no infatigável mar: E das naus

orando invocam os jovens do grande Zeus

com alvos cordeiros, indo à extremidade

da popa: a ela forte vento e a vaga marinha

submergem. Mas eles de súbito surgem,

com louras asas, a ruflar pelo firmamento;

e,de pronto,de graves ventos cessam as procelas,

vagas dispersam do alvo salso mar em pleno pélago;

belos sinais e libertam da fadiga. Os nautas com a visita

alegram-se: cessam a mísera fadiga.

Salve, Tindáridas, cavaleiros de ágeis corcéis:

depois também de vós me lembrarei em outra canção.

(tradução de Rafael Brunhara)

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