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DEMÉTER

Domínios: Agricultura, Grãos e Pão, Vida após a morte; Maternidade

Animais: Serpente, Suínos, Lagartixa; Cavalo

Plantas: Trigo, Cevada, Papoula, Menta

Símbolos: Tocha, coroa, talos de grão

Cores: Amarelo

Ofertas: Grãos (exceto feijão), papoula, girassol, cipreste, resina de estoraque, mirra, almíscar, olíbano; trigo, milho, cereais

Epítetos: Erinus (Feroz), Kabeiria (Mãe dos cabiros), Karpophoros (Que traz os frutos), Khloe (Verdejante), Khthonia (Terrena), Kidaria, Kourotrophos (Protetora da juventude), Lousia (Terna), Melaina (Negra), Meter (Mãe)

Festivais: Epikleidia (data desconhecida), Grandes Mistérios Eleusinos (Boedromion 14-21), Haloa (26 Poseidon), Skira (12 Skiraphorion), Stenia (9 Puanepsion), Thesmophoria (9, 11-13 Puanepsion)

Hino Órfico (#40) a Demeter Eleusinia:

Deo, divina mãe de todos, deusa de muitos nomes,

augusta Deméter, educadora de jovens e doadora de prosperidade e riqueza;

Tu nutres as espigas de milho, ó doadora de tudo,

e tu te delicias na paz e no laborioso trabalho de parto.

Presente na semeadura, empilhagem e debulha, és o espírito do fruto não-maduro,

tu que habitas no sagrado vale de Eleusis.

És charmosa e amável, dás sustento a todos os mortais,

foste a primeira a pôr o arado no boi para lavrar a terra

e a enviar de cima a baixo uma adorável e rica colheita aos mortais.

Através de ti, tudo cresce e brota, ó ilustre companheira de Bromio

e, carregando a tocha e sendo pura, delicias-te com a produção do verão.

De debaixo da terra apareces e com todos és gentil,

Ó sagrada cuidadora dos jovens e amantes das crianças e da boa descendência.

Tu conduzes tua carruagem com rédeas nos dragões,

e circulas teu trono girando e uivando em êxtase.

Com filha única, mas com muitas crianças e muitos poderes sobre os mortais,

Tu manifestas tua miríade de rostos à variedade de flores e botões sagrados;

venha, abençoada e pura, e carregada dos frutos do verão,

traga paz junto com as regras de boas-vindas da lei,

riquezas também, e prosperidade, e saúde que nos governa a todos.

 

Hino Homérico XIII - A Deméter

Começo a cantar à Deméter de cabelos opulentos, a temível deusa, a ela e à sua amável filha Perséfone. Saúdo-te, deusas! Mantenham esta cidade segura, e governem a minha canção.

(traduções da Alexandra)

 

Hino Homérico 2, a Deméter

Canto Deméter, de belos cabelos, deidade solene,

Junto da filha de esguios tornozelos, a quem Edoneu

Arrebatou por presente de Zeus de ampla vista, troante,

Longe Deméter de espada dourada, de fruto brilhante,

Quando brincava entre as oceaninas, de bustos profundos,

De colher flores de rosa, açafrão e violetas bonitas,

Sobre um gramado macio, e de íris bem como jacinto,

E de narciso – num dolo de Gaia à garota florente

Dentro do plano de Zeus, alegrando o que tudo recebe –,

Maravilhoso e brilhante: um espanto de ver para todos,

Para os eternos divinos e para os humanos mortais.

Dele a partir das raízes cem brotos de flor despontavam.

Dúlcido odor exalava, tão doce que tudo, do céu

À vasta terra e até a onda salina do mar lhe sorriu.

Maravilhada, buscou alcançá-lo com ambas as mãos,

Belo ornamento. Porém a vastívia terra se abriu

Junto à planície de Nisa e o que tudo retém irrompeu

Com montaria imortal, o Cronida de múltiplos nomes.

Tendo-a tomado contrário à vontade, ao palácio dourado

Foi-se com ela em lamentos. Gritava com voz incessante

Súplica ao pai que de Crono nasceu, o mais alto e mais nobre.

Nenhum dos deuses eternos, nenhum dos humanos mortais

Pôde escutar sua voz, nem olivas de frutos brilhantes,

Mas a donzela nascida de Perses, de tenro pensar,

Hécate, do diadema esplendente, da gruta a escutou,

E Hélios também, o senhor que de Hipérion nasceu, reluzente,

Ouve o pedido da moça ao pai Crônida, mas apartado

Dos demais deuses estava, em seu templo onde muitos suplicam,

A receber oferendas venustas dos homens mortais.

Contra a vontade a levava (seguindo um alvitre de Zeus,

Pai da donzela, e irmão do que tudo retém e recebe)

Com imortal montaria o Cronida de múltiplos nomes.

Quanto ainda pôde mirar para terra e pro céu estrelado,

E para o mar de correntes possantes, repleto de peixes,

E para o brilho do sol, ela teve esperança de ver

A mãe zelosa e a família dos deuses eternossurgentes:

Tanto a esperança acalmava-lhe a mente sobeja na dor.

... E ressoaram os cumes dos montes e o fundo do mar

Junto da voz imortal: escutou-lhe sua mãe senhoril.

Dor aguçada assaltou-lhe no seu coração. Das madeixas

Ambrosiais, a mantilha rasgou com as mãos, em pedaços;

De ambos os ombros lançou para o chão o seu manto ciânico

E disparou como um pássaro ao longo da terra e das águas,

A procurar. Mas dizer a verdade não houve ninguém

Dentre os divinos nem dentre os humanos mortais que o quisesse,

Nem dentre as aves – nenhuma lhe foi mensageiro veraz.

Por nove dias depois pela terra, a senhora Deméter

Foi-se vagando com tochas acesas levadas às mãos.

Nem de ambrosia jamais nem de néctar, delícia potável,

Se alimentou, sofredora, nem água em seu corpo aspergiu.

Mas, quando a décima aurora chegou até ela, brilhante,

Hécate veio encontrá-la trazendo luzeiros nas mãos

E anunciando-lhe então proferiu a palavra e falou:

"Dona Deméter, que guia as sazões, donatária de luz,

Quem dentre os deuses celestes ou dentre os humanos mortais,

Rapta Perséfone e causa-te dor para o teu coração?

Voz eu ouvi, mas não pude contudo enxergar com os olhos

Quem o seria. De pronto, professo-te tudo sem erro."

Hécate assim lhe falou, mas não houve resposta em discurso

Vinda da filha de Reia, que subitamente com ela

Vai-se, com tochas acesas brilhando, portadas nas mãos.

A Hélios, chegaram, vigia dos deuses bem como dos homens.

Frente aos cavalos puseram-se e a deusa entre as deusas lhe disse:

"Hélios, ao menos, respeita-me, deusa que sou, se jamais

Minhas palavras ou feitos ao teu coração te aqueceram.

Moça eu gerei, um rebento tão doce, esplendente na forma.

Dela, pelo éter infértil, eu ouvi um gemido adensado

Como sofresse, porém com os olhos não pude mirá-la.

Tu, todavia, por tudo que existe na terra e no mar,

Do alto do éter divino perscrutas usando teus raios.

Diz-me sem falha: o querido rebento – se acaso tu viste –,

Quem, apartado de mim, agarrando em forçosa violência,

Foi que o levou, se um dos deuses ou um dos humanos mortais."

Disse-lhe assim. Em resposta o nascido de Hipérion falou-lhe:

"Filha de Reia, de belos cabelos, senhora Deméter,

Tu saberás, pois venero-te muito e de ti me apiedo,

Sôfrega pela menina de esguio tornozelo: não outro

Foi causador dentre eternos senão o nubícogo Zeus,

Que a concedeu para Hades chamá-la de esposa formosa;

Deu-a ao irmão, que, por vez, para o fundo do breu nevoento,

Rapta-a e a carrega em seu carro por mais que ela muito gritasse.

Cessa, contudo, divina, esse ingente gemido. Não deves

Ter tanta cólera em vão dessa forma. Não é um impróprio

Genro entre eternos aquele, Edoneu, o de múltiplos nomes:

É teu irmão; foi gerado em conjunto; também – quanto às honras

Que ele ganhou, quando em três a partilha foi feita de início –,

Entre os que vivem consigo, seu lote é ser rei sobre todos."

Tendo assim dito chamou os cavalos. Por sob ameaças,

Logo carregam o carro veloz quais alígeras aves.

Nela, vem dor mais terrível e infame no seu coração.

Pelo Cronida de nuvens escuras irada a tal ponto,

Ela apartou-se da grege divina e do Olimpo elevado

Indo às cidades dos homens e para seus fartos cultivos,

Branda em beleza por longo interstício. Ninguém dos varões

A distinguiu quando a viu, nem das damas de funda cintura,

Antes de que ela chegasse na casa do experto Celeu,

Que era senhor, nesse tempo, de Elêusis fragrante em incenso.

Com coração dolorido, sentou-se por perto da estrada,

Junto do poço da virgem, de que os cidadãos aduavam,

Num sombreado debaixo de onde cresciam olivas,

Assemelhada a uma velha vetusta, que da gestação

Já se gastou e dos dotes da amante de láurea Afrodite,

Da qualidade das amas de reis que ministram as leis

E governantas de infantes ao longo de ecoantes alcovas.

Viram-na as filhas do filho nascido de Elêusis, Celeu,

Vindo por água de fácil extração, que depois levariam

Dentro de jarras de bronze a caminho da casa paterna.

Quatro elas eram, quais deusas, ornadas na flor juvenil:

Bela Demó e Calídice, junto a Clesídice e ainda

Calitoé, que entre todas as outras nascera primeiro.

Não a souberam: os deuses são árduos de ver por mortais.

Pondo-se próximas dela, disseram palavras aladas:

"Quem és e donde, anciã, que nasceste entre os homens de outrora?

Qual a razão de partires da pólis, e nem das moradas

Te aproximares? Aqui há mulheres nas casas vultosas,

Velhas assim como tu, bem como outras mais jovens também.

Ambas teriam a ti por amiga em palavras e em atos."

Isso disseram. Então respondeu a senhora das deusas:

"Filhas queridas – quem quer que vós fordes em meio às mulheres –,

Eu vos saúdo e vos digo ademais que não é vergonhoso

Pronunciardes discursos dizendo palavras verazes.

Eu sou chamada Dosó. Deu-me o nome a senhora materna.

Vim logo agora de Creta no dorso comprido do mar,

Mesmo que não o quisesse, forçada em forçosa violência.

Homens ladinos levaram-me embora. Depois, em seguida,

Foram com rápida nau para Tórico. Lá, as mulheres

Desembarcaram em grupos, seguidas por eles,

E preparavam banquete do lado da proa da nau.

Mas coração não me aprouve o repasto gentil para mente.

Desembarcando em segredo, através da melânica terra,

Eu escapei dos meus mestres soberbos, que enfim não lucrassem

Com minha honra por me carregarem à venda no mar.

Vim para cá dessa forma, uma errante. Tampouco sabia

Qual era a terra e quem eram aqueles que aqui são nascidos.

Que vos concendam contudo os que fazem morada no Olimpo,

Todos, varões que vos sejam esposos, e dar luz a filhos,

Como desejam os pais: mas de mim tende pena, meninas.

Isso me estabelecei claramente, que assim eu o saiba,

Filhas queridas, zelosas, de quem é a casa a que chego?

De qual varão ou senhora? Que assim eu os sirva, zelosa,

Nos afazeres cabíveis a velhas mulheres fazerem.

Para um bebê neonato, levado em meus braços dobrados,

Belo cuidado daria e também manteria o palácio,

Esticaria os lençóis no interior das alcovas bem-feitas

Do meu senhor e os trabalhos iria ensinar às mulheres."

Disse a deidade. Depois, respondeu a virgínea donzela

Dita Calídice, que era a mais bela entre as filhas celeias:

"Mãe, os presentes dos deuses, por mais que soframos à força,

Nós suportamos, humanos, pois são bem mais fortes que nós.

Vou te dizer claramente isso tudo e informar-te por nome

Quais os varões a quem há um enorme poder nesta terra,

Eles que têm o respeito do povo e a mantilha da pólis

Salvam por meio do alvitre e da sua justiça escorreita:

Ambos Triptólemo de resoluta vontade e Diócles,

E Polixeno também junto do irreprovável Eumolpo,

Junto de Dólico bem como de nosso pai varonil.

Há para todos esposas que cuidam do lar nos palácios.

Dentre elas todas, não há quem iria à primeira das vistas,

Desestimando-te a forma, da casa por isso expulsar-te,

Mas, sim, irão receber-te, pois és claramente deiforme.

Se tu quiseres, espera, que iremos à casa paterna

Para informar nossa mãe, Metaneira de funda cintura,

Desses assuntos, de todos, a fim de que sejas chamada

À nossa casa, não tendo que uma outra morada buscar.

Ela possui um só filho, tardio, no palácio bem-feito,

Tardinascido, mas muito bem-vindo após múltiplas preces.

Se tu puderes criá-lo até ter a medida de jovem,

Mui facilmente qualquer das femíneas mulheres, ao ver-te,

Te invejaria: são dádivas tais que em criá-lo terias."

Disse-lhe assim. Assentiu por sua vez com o rosto. Luzentes

Baldes então tendo enchido com água, carregam, briosas.

Logo chegaram no enorme palácio paterno e contaram

Rápido à mãe o que viram e ouviram. Mais rápido ainda,

Vindo ordenou que a chamassem a fim de ter paga infinita.

Elas, quais cervos ou mesmo bezerros que na primavera

Vão saltitando num prado, aplacado o desejo com pasto,

Elas assim, segurando nas dobras das vestes amáveis,

Iam correndo por via deserta. Ao redor, os cabelos

Sobre seus ombros fluíam semelhos à flor do açafrão.

Próximo à estrada encontraram a deusa esplendente onde a haviam

Antes deixado. Depois para a casa do pai estimado

Foram à frente. Detrás com o seu coração dolorido,

Ela seguia com rosto abaixado. Ao redor, um vestido

Cor do oceano envolvia-lhe os pés delicados de deusa.

Logo a mansão de Celeu alcançaram, aluno de Zeus.

Foram adentro do pórtico até onde a mãe senhoril,

Junto à coluna do teto de firme feitura, sentava

Com um bebê neonato no colo. Acorreram-lhe as filhas.

Mas, quando pôs os seus pés na soleira, alcançou o batente

Com a cabeça e um divino esplendor preencheu os umbrais.

Por reverência, respeito e esverdeado temor foi tomada.

De seu assento se ergueu e ordenou que ela ali se sentasse.

Mas não Deméter que guia as sazões, donatária de luz:

Não desejou se assentar sobre o trono de aspecto brilhante,

Mas se mantinha silente com seus belos olhos baixados

Antes de Iambe, sabendo cuidados, dispôr para ela

Outra cadeira, do lado, e cobri-la com peles argênteas.

Lá se sentando, mantinha seguro nas mãos o seu véu.

Por muito tempo, sofrendo silente, quedou sobre o banco.

Nem por palavras saudava as pessoas tampouco por gestos,

Mas sem risada, mantendo o jejum, sem comer nem beber,

Ela minguava à saudade da filha de funda cintura,

Antes de Iambe, sabendo cuidados, por meio de troças

Muitas, fazendo piadas, mudar a solene senhora

Para se rir e sorrir e ter ânimo mais benfazejo.

(Ela mais tarde também, num porvir, agradou seus humores.)

Oferecia-lhe então Metaneira uma taça que enchera

Com vinho doce qual mel, mas não quis. Disse impróprio tomar

Vinho vermelho. Mandava que dessem cevada com água

Mistas, a fim de tomar com um toque gentil de poejo.

Feita a poção, ofertou-a conforme pedira, à deidade.

Tendo a aceitado por sacro costume, Deméter excelsa

... Principiou Metaneira de bela cintura a falar-lhe:

Salve, mulher! Eu não temo que vinda de maus genitores

Sejas, mas sim de excelentes, pois vê-se respeito em teus olhos

E gratidão, como se descendesses de reis julgadores.

Mas os presentes dos deuses, por mais que soframos à força,

Nós suportamos, humanos, pois tem-se o pescoço no jugo.

Mas como aqui tu chegaste, terás tudo quanto eu puder:

Cria meu filho, nascido tardio para além da esperança,

Este que os deuses mandaram, que é muito querido de mim.

Se tu puderes criá-lo até ter a medida de jovem,

Mui facilmente qualquer das femíneas mulheres, ao ver-te,

Te invejaria: são dádivas tais que em criá-lo terias."

Por sua vez, proferiu-lhe Deméter de bela coroa:

"Eu te saúdo, mulher! Que os divinos te deem benesses!

Receberei de bom grado o teu filho, conforme me ordenas.

Hei de criá-lo e jamais por descuido da sua babá

Há de um feitiço afligi-lo nem mesmo "o que ceifa por baixo",

Pois sei de antídoto muito mais forte que "o ceifa-madeira",

Sei de excelente resguardo a feitiço de múltiplas dores."

Tendo dessarte falado aceitou-o no peito oloroso

Com suas mãos imortais. Em seu íntimo alegra-se a mãe.

Dessa maneira passou a criar no palácio o brilhante

Filho do arguto Celeu, Demofonte, que de Metaneira

Bem-cinturada nascera. Cresceu como um par dos divinos:

Pão não comia, nem mesmo sugava do leite da mãe,

Visto que ao longo do dia Deméter de bela coroa

Com ambrosia o ungia, qual fosse rebento de um deus,

Tendo-o bem junto do peito e insuflando-o com sopro adoçado;

Mas pela noite encobria-o em chamas, qual fosse um tição,

Sem que seus pais o soubessem. Crescia-lhes como um prodígio,

Tanto precoce cresceu: parecia ser um dos divinos.

E com efeito o teria tornado imortal, sem velhice,

Caso, com insensatez, Metaneira de bela cintura,

Espionando de noite a partir de seu quarto oloroso,

Não os notasse. Mas ela gritou e espalmou suas coxas,

Apavorada por conta do filho e afligida em seu peito,

E lamentando-se então proferiu as palavras aladas:

"Meu Demofonte, a estrangeira com chamas ingentes te encobre

E me coloca em gemidos e preocupações lutuosas!"

Disse dessarte em lamento, e a divina entre as deusas a ouviu.

Colerizada com ela, Deméter de bela coroa,

Tendo tirado do fogo com mãos imortais o menino

Que ela gerara na casa já quando não tinha esperança,

Lança-o no chão, irritada no seu coração sobremodo,

E ao mesmo tempo maldiz Metaneira de bela cintura:

"Néscios humanos! Ineptos em reconhecer a medida

De quanto bem sobrevém para vós tanto quanto do mal!

Tu pela tua insciência causaste incurável ferida!

Saiba-se a jura dos deuses, pela água implacável do Estige,

Pois imortal e também sem velhice, por todos os dias,

Tua criança eu teria tornado, com honra indelével.

Ora não mais poderá se evadir do destino e da morte.

Honra indelével lhe irá persistir para sempre, contudo,

Por ter subido em meu colo e dormido amparado em meus braços.

Ao lhe chegarem as Horas e os anos findando seu curso,

Vede que os filhos de Elêusis com guerras e gritos terríveis

Vão engajar-se uns aos outros, constantes, por todos os dias.

Eu sou Deméter, quem honras detém, geratriz dos maiores

Júbilos para imortais e mortais e também benefícios.

Vamos agora! Que um templo bem grande e um altar logo abaixo

Os cidadãos sob a pólis e as altas muralhas me façam

Sobre o Calícoro, na cumeeira de um monte elevado.

Ritos secretos eu mesma vos ensinarei, que depois

Ao perfazê-los sem mácula ireis alegrar meu sentido."

Tendo assim dito, a deidade alterou sua forma e estatura,

Posta a velhice de lado. Ao redor exalava beleza:

Desde os vestidos fragrantes um amabilíssimo olor

Se dissipava; de longe luzia da derme imortal

Brilho da deusa; dourados cabelos cresciam-lhe aos ombros;

Com o clarão preencheu-se a morada robusta, qual raio.

Foi-se em seguida da casa. Já dela os joelhos vacilam:

Permaneceu muito tempo sem voz, nem sequer do menino

Tardinascido lembrou, de tomá-lo de volta do chão.

Suas irmãs todavia escutando-lhe a voz lamentável

Logo saltaram dos leitos cobertos: então uma delas

Tendo o tomado nas mãos o coloca de junto do peito;

Outra reacende a lareira; e a terceira, com pés delicados,

Logo se apressa em trazer sua mãe do aposento fragrante.

Aglomeradas em torno lavavam-no enquanto chorava,

Dando-lhe muito carinho, mas seu coração não calmava:

Eram piores as aias e as amas que agora o guardavam.

Elas então toda a noite aplacavam a deusa famosa,

Trêmulas pelo terror. No momento em que a Aurora surgiu,

Ao poderoso Celeu infalíveis palavras disseram,

Como mandara a deidade de bela coroa, Deméter.

Ele, depois de chamar para a ágora o povo abundante,

Manda que um templo opulento a Deméter de belos cabelos

Façam, também um altar sobre o cume de um monte elevado.

Eles de pronto escutaram e lhe obedeçaram aos ditos.

Como mandara, fizeram; e o filho cresceu como um nume.

Quando por fim terminaram e deram por feito o trabalho,

Foram-se ao lar, cada qual para o seu, mas a loura Deméter,

Lá se sentando apartada de todos os outros ditosos,

Inda minguava à saudade da filha de funda cintura.

O mais terrível dos anos na terra de farto sustento

Fez para os homens, um ano de cão. As sementes, a terra

Não germinava: ocultava-as a bem-coroada Deméter.

Muitos arados recurvos os bois arrastavam em vão.

Muita cevada brilhante no chão se jogou sem sucesso.

Ela teria arrasado a linhagem dos homens mortais

Pela estiagem terrível, privando das honras famosas

E sacrifícios aqueles que fazem morada no Olimpo,

Zeus não houvesse notado e no espírito então compreendido.

Íris primeiro aurialada enviou para que ela chamasse

A de adorável figura, Deméter de belos cabelos.

Disse. Ela ao mando de Zeus, do Cronida de nuvens escuras,

Obedeceu e cruzou o entremeio com rápidos pés.

Logo chegou à cidade eleusina, fragrante de incenso,

Onde no templo encontrou, com vestido soturno, Deméter,

E lhe falou, proferindo as seguintes palavras aladas:

"Zeus pai te chama, Deméter, o sábio em saberes perenes,

Para que vás à família dos deuses eternossurgentes.

Vai! E que não se descumpra a palavra de Zeus que lhe digo!"

Disse-lhe assim, suplicante, mas seu coração não consente.

Mais uma vez, o pai manda-lhe os deuses ditosos e eternos,

Todos, um deus atrás de outro. Partindo ordenados assim,

Eles chamavam-na e davam presentes venustos e vários

E honras também, tantas quantas pudesse querer entre eternos.

Mas ninguém pôde suadir as entranhas nem o pensamento

Dela iracunda no seu coração: rechaçava os discursos,

Pois prometera jamais ascender para o Olimpo fragrante

Nem enviar para cima, de dentro da terra, a colheita

Antes de ver com seus olhos a filha de belo semblante.

Zeus que ressoa profundo, o de vasta visão, quando o ouviu,

Fez com que o auricetrado argicida para o Érebo fosse:

Que ele falando de perto palavras suaves com Hades

Exconduzisse Perséfone augusta do breu nevoento

Rumo da luz junto aos deuses, a fim de que então sua mãe

Ao contemplá-la com seus próprios olhos cessasse o rancor.

Hermes não desacatou, mas de súbito ao fundo da terra

Ele partiu apressado, baixando do assento do Olimpo.

Logo encontrou o senhor da morada no seu interior,

Em um sofá, reclinado com a pudorosa consorte

Muito contrário à vontade, saudosa da mãe, que à distância

Planos terríveis pensava por atos dos deuses ditosos.

Pondo-se próximo dele, falou-lhe o potente Argicida:

"Hades de negros cabelos, reinante entre os já perecidos,

Zeus pai mandou-me guiar para fora Perséfone augusta

Do Érebo para com eles, a fim de que a mãe, vendo a moça

Com olhos próprios, refreie o rancor e sua cólera horrível

Contra os eternos, pois ela intenciona um ingente trabalho:

Arruinar a impotente família dos homens terrestres

Ao ocultar as sementes na terra, privando das honras

Os imortais. Ela tem um terrível rancor, nem aos deuses

Junta-se, mas no interior de seu templo fragrante, apartada,

Senta-se enquanto retém a cidade rochosa de Elêusis."

Disse dessarte. Sorriu-lhe Edoneu, que entre os ínferos reina,

Com os sobrolhos, mas não descumpriu o comando de Zeus rei,

Pois de imediato ordenou a Perséfone percipiente:

"Vai-te, Perséfone, para tua mãe de vestido soturno,

Tendo uma força gentil em teu peito e no teu coração,

Nem tenhas ódio excessivo demais do que aos outros por mim.

Não te serei um consorte de nada indevido entre eternos,

Visto que sou mesmo irmão de Zeus pai. Quando aqui te encontrares,

Tu serás mestre de todos, de quantos viverem e andarem,

E honras ainda terás entre eternos, maiores que todas.

Dentre os injustos, terá pagamento por todos os dias

Quem não fizer sacrifícios a fim de agradar teu poder,

Feitos sem mácula, todos cumpridos com dons adequados."

Disse dessarte. Sorriu-lhe Perséfone muito prudente

Rapidamente se ergueu de alegria, mas ele, contudo,

Doces sementes lhe deu de romã, que comesse, em segredo,

Sendo cuidoso que não demorasse por todos os dias

Junto de novo a Deméter augusta de peplo soturno.

Os seus cavalos à frente do carro dourado no jugo

Pôs, imortais, Edoneu que exercita o comando de muitos.

Ela subiu para o carro e a seu lado o potente Argicida,

Tendo tomado nas mãos tanto as rédeas quanto o chicote,

Foi-se através do palácio e partiu: seus cavalos voaram.

Atravessaram velozes estradas compridas. Nem mar

Nem mesmo as águas dos rios nem os vales gramados dos montes

Nem as montanhas puderam deter seus cavalos eternos,

Que sobre todos singraram os ares profundos, correndo.

Fê-los parar onde estava Deméter de bela coroa,

Logo de frente do templo fragrante. Quando ela a notou,

Foi-se correndo qual mênade ao longo de um monte silvoso.

Já por seu turno, Perséfone, ao ver os belíssimos olhos

De sua mãe, afastou-se de carro e cavalos num salto

Para alcançá-la e lançou-se-lhe em torno ao pescoço, abraçando-a.

Mas, ao reter sua filha querida no entorno das mãos,

Seu coração desconfia de um dolo e recua em terror.

Logo, cessando o carinho, em discurso lhe fez a pergunta:

"Filha, encontrado-se ao fundo da terra tu não me comeste

De um alimento? Relata e não guardes: que as duas saibamos,

Para que, vinda da tua estadia com Hades horrível,

Possas viver junto a mim e ao Cronida de nuvens escuras,

Tendo honrarias também entre todos os outros eternos.

Mas, se comeste, de novo voltando ao profundo da terra,

Tu morarás por um terço das Horas a cada um dos anos,

E as outras duas ao lado de mim e dos outros eternos.

Mas, quando a terra com flores fragrantes e primaveris

De toda sorte florir, novamente do breu nevoento

Tu voltarás, grande espanto aos divinos e aos homens mortais.

Mas dize como levou para baixo do breu nevoento

E com que dolo raptou-te o potente que tudo retém."

Disse-lhe então em resposta Perséfone muito venusta:

"Eu para ti, minha mãe, vou dizer por completo a verdade.

Quando a mim Hermes chegou, mensageiro veloz que traz sorte,

Para, à presença do Crônida pai e dos outros celestes,

Do Érebo me retirar, que me vendo com teus próprios olhos

Apaziguasses rancor aos eternos e cólera horrível,

Eu, de imediato, saltei de alegria. Mas ele, em segredo,

Doces sementes me deu de romã com que me alimentasse,

E a contragosto por meio de força forçou-me a comê-las.

Como levou-me por sólida astúcia do filho de Cronos,

Meu próprio pai, carregando-me para o profundo da terra,

Eu contarei e direi sobre tudo conforme me pedes.

Todas de fato brincávamos sobre um gramado amorável:

Fano e Leucipo assim como Electra e também Ianté,

Junto a Melite e Iaqué, com Rodeia e Caliroé,

Com Melobósis e Tíque e com Ociroé rosto-em-flor,

E com Criseida, Ianeira, Acaste, e também Admete,

E Rodopé e Plutó e também a amorável Calipso,

E com Estige e Urânia e com Galaxaure adorável,

Junto de Palas guerreira e com Ártemis atiradora,

Todas brincávamos de colher flores amáveis nas mãos,

Entre o açafrão delicado e entre a íris, jacinto também,

Bem como brotos de rosas e lírios, espanto de ver,

E de narciso, que a terra gerava semelho a açafrão.

Tudo eu colhia feliz, mas a terra, por baixo, se abriu:

Dela saltou o senhor poderoso que tudo retém,

Que me levou para baixo da terra em seu carro dourado,

Muito contrário à vontade. Na voz, eu gritei estridores.

Essa, por mais que me doa, te digo ser toda a verdade."

Elas, concordes em ânimo, então, pelo resto do dia,

Muito no seu coração e em seu ânimo se acalentaram

Com calorosos abraços, cessando-se a dor em seu ânimo.

Muita alegria uma a outra ofertava e também recebia.

Aproximou-se-lhes Hécate do diadema esplendente.

Muito abraçou a menina sagrada nascida a Deméter.

Desde esse tempo a senhora lhe foi atendente e ministra.

Zeus de amplo olhar, que ressoa profundo, enviou-lhes de núncio

Reia de belos cabelos, a fim de que à grei dos divinos

Ela levasse Deméter de escuro vestido. Honrarias

Lhe prometeu, quais pudesse querer entre os deuses eternos,

E concordou que sua filha demore, por cada um dos anos,

Uma das tríplices partes abaixo do breu nevoento

E as outras duas ao lado da mãe e dos outros eternos.

Disse e a deidade não desacatou as mensagens de Zeus.

Rapidamente, lançou-se voando dos picos do Olimpo.

Logo chegou até Rário, nutriz, a mais rica das terras

Antes, porém nesse tempo não era nutriz, mas inerte,

Toda sem folhas. A branca cevada encontrava-se oculta:

Plano que foi de Deméter de esguios tornozelos. Contudo,

Logo se iria cobrir com espigas compridas de milhos,

Ao florescer da estação, e os opíparos sulcos da terra

Logo estariam repletos de grãos e de feixes de espigas.

Lá sobreveio primeiro partindo do éter infértil.

Mutuamente se viram, contentes, com ânimo alegre.

Reia com seu diadema esplendente lhe disse o seguinte:

"Vamos, filhinha, que Zeus de amplo olhar, que ressoa profundo,

Chama-te junto da grei dos divinos. Também honrarias

Lhe prometeu, quais puderes querer entre os deuses eternos

E concordou que tua filha demore, por cada um dos anos,

Uma das tríplices partes abaixo do breu nevoento

E as outras duas ao lado da mãe e dos outros eternos.

Disse cumprir-se dessarte e assentiu com a sua cabeça.

Vem, minha filha! Obedece o que digo! De modo excessivo,

Não te enfureças mais com o Cronida de nuvens escuras.

Faz com que cresçam os frutos nutrizes de pronto aos humanos."

Disse, e Deméter de bela coroa não desobedece.

Logo ela fez despontarem os frutos nos férteis terrenos.

Toda com folhas e flores também a vastíssima terra

Se carregou. Em seguida, indo aos reis que ministram as leis,

Ela mostrou a Triptólemo e para Diócles ginete

E para a força de Eumolpo e a Celeu, comandante de povos,

A liturgia dos ritos e a todos também os mistérios.

Mas, para força de Eumolpo e a Celeu e também a Diócles,

Deu ritos sacros, que não se transgridem nem mesmo se aprendem,

Nem se proferem, pois grande respeito aos divinos os cala.

Próspero é aquele que os viu entre os homens que vivem na terra;

Mas incompleto quem não participa dos ritos, nem nunca

Tem bom destino morrendo, debaixo do breu nevoento.

Logo depois, quando tudo perfez a divina entre os deusas,

Foi-se a caminho do Olimpo ao encontro dos outros divinos,

Onde demoram do lado de Zeus que se apraz com trovões,

E junto à augusta e sagrada. Muitíssimo próspero é quem

Eles solícitos amam, dos homens que vivem na terra.

Logo lhe enviam ao fogo do lar no seu grande palácio

Pluto, que ao homens mortais oferece abundância e riqueza.

Mas vamos lá, portadora da terra fragrante eleusina,

Paros marinha e a rochosa cidade de Antrona também,

Dona que cedes a luz, que conduz as sazões, Deo rainha,

Tu e também tua filha Perséfone, muito venusta,

Pela canção, meu sustento agradável, solícitas, manda!

Ora de ti eu irei me lembrar e de uma outra canção!

(Tradução de Leonardo B. Antunes)

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